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Forró: Entrevista com Mestrinho

09:31



Todas as manhãs, depois que minha filha acorda, abrimos todas as cortinas de casa. A trilha sonora para este momento é sempre a mesma e bem sugestiva. Na letra desta música, damos bom dia ao Sol, ao Mar e a Mãe Natureza. Damos bom dia ao pai, bom dia a mãe e a gratidão por ensinar os primeiros passos. Impossível não acordar bem.

Essa canção, chamada Bom Dia, é do grande acordeonista Mestrinho. Um músico da nova geração, mas que já deixou marcado seu nome na história da Música Popular Brasileira (MPB), ao tocar ao lado de grandes nomes como Dominguinhos, Elba Ramalho, Gilberto Gil e Ivete Sangalo. 

Forrozeiro nato, Mestrinho, que iniciou sua carreira no Trio Juriti, nos contou um pouco da sua relação com os grandes nomes da MPB e, principalmente, sua relação de amor com a música. Contou também suas inspirações para o futuro.

Confira a entrevista:

EQM- Conhecemos um pouco da sua história, mas como surgiram as oportunidades de tocar com grandes nomes como Dominguinhos, Elba, Gil e Ivete? 
Mestrinho- A primeira que surgiu foi com Dominguinhos, que eu conheci através do meu pai, Erivaldo de Carira, aqui em São Paulo. Dominguinhos me deu seu telefone e eu sempre ligava para falar com ele. Eu ia aos shows e ele me deixava levar a sanfona. No lançamento do DVD dele, eu fiz um show com ele e no outro dia fui convidado para tocar com Dominguinhos. Com a Elba -eu já estava com Dominguinhos-  ela já tinha me visto tocar. Quando surgiu a oportunidade, ela me convidou para tocar com ela. Dominguinhos foi minha maior vitrine para eu tocar com esses outros artistas. Com Gilberto Gil, eu tive o prazer de tocar com ele, graças o Toninho Ferraguttti, que era sanfoneiro dele, na época, e, quando não podia fazer alguns shows, me colocava no lugar. Agradeço muito a ele por isso.  Já com a Ivetinha, ela me ligou do nada, ouvi algumas histórias de que ela estava pesquisando alguns vídeos do Dominguinhos, ela me viu e gostou do meu trabalho.  Ela me ligou, pediu para produzir algumas coisas para ela, enfim, aí surgiu o convite do DVD e eu também a convidei para gravar no meu disco e foi maravilhoso. 

EQM- Quando você começou, esses músicos já eram consagrados, você já imaginava dividir palco com tanta gente boa?
Mestrinho- Quando comecei a tocar nunca imaginei tocar com tais artistas, mas, ao longo da minha carreira, eu comecei a conhecê-los profundamente e a partir daí surgiu o sonho. Graças a Deus realizei! Fico muito feliz por isso.     
Ao lado do grande mestre Dominguinhos.
EQM-Onde você espera chegar como músico?
Mestrinho-Minha maior ambição é a música, e a música é infinita. Eu nunca vou parar de estudar e evoluir. Eu não sei onde espero chegar, mas com certeza é no nível mais alto que eu puder alcançar. 

EQM- Acha que está próximo?
Mestrinho-Espero que não, pois não quero morrer agora. (risos)

EQM-
Se você tivesse que atribuir uma qualidade sua ao seu atual momento musical. Qual seria? 
Mestrinho-A maior qualidade é a liberdade de criatividade que eu tenho. Hoje, não tenho fronteiras para criar, compor e improvisar. Eu me sinto num momento muito íntimo com a música e muito à vontade. Acredito que não exista barreiras, nem certo ou errado, no nível que eu estou com a relação à música.

EQM-Quanto tempo do seu dia é dedicado aos estudos?
Mestrinho-Não existe tempo exato e nem regra, tem dia que eu acordo e toco o dia inteiro. Tem dia que eu toco duas horas, tem dia que não toco, mas escuto música pra caramba. Acho que meu maior estudo é ouvindo vários tipos de música e quando eu pego no instrumento, eu só começo a criar coisas próprias. Então, não existe uma rotina de estudo, eu acredito que dia após dia, vou fazendo do jeito que minha alma, minha mente e minha cabeça aceita.

EQM- Quantos instrumentos você toca?
Mestrinho- Que eu toco de verdade mesmo, é só o acordeom. Os outros é um passeio, um hobbie. Porque eu toco um pouco de tudo, violão, bateria, baixo, guitarra, piano. Zambumba e triangulo, eu toco um pouco também. Mas, eu acredito que, tocar de verdade, que eu pego e não sinto vergonha e nem medo é o acordeom. 

EQM-Esse convívio com grandes nomes deve ter trazido grandes ensinamentos, o que você mais aprendeu em relação a carreira?
Mestrinho- Eu acho que o importante de tudo isso é o amadurecimento, e eu amadureci muito com esses artistas. Aprendi muita coisa a respeito de presença de palco e como conduzir a carreira vendo os bastidores e estando junto. E só de estar em momentos marcantes desses artistas, em cima do palco, recebendo os aplausos junto deles, isso me amadureceu muito e me tranquilizou para eu seguir a minha carreira.

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EQM- Você está totalmente inserido no circuito do pé de serra. Como é transitar de um cenário onde há camarim com frutas, estrutura de palco, etc., para outro onde, muitas vezes, não há um banheiro para o artista ou um som de qualidade.
Mestrinho-É complicado e ruim um dia você estar sendo bem valorizado e no outro estar indo tocar em um lugar que você sente que não está sendo valorizado. E isso não é questão de dinheiro. Não precisamos ser recebidos em um camarim de glamour, mas sim com o mínimo de respeito, atenção e valorização ao artista. Se eu for tocar em um palco gigante, com um artista gigante e ser recebido muito bem, eu quero tocar também em um palco mais simples, mas sentir que estou sendo recebido com carinho e com valor. Isso implica em um camarim ajeitadinho, um esforço do produtor para receber a gente bem. Pois se a gente chega lá e vê que é de qualquer jeito, a gente se sente mal. Às vezes, eu pego para tocar em um lugar que o som é horrível, e o som é primordial, tem que estar bom, pois isso interfere na nossa saúde. Eu dedico minha vida a música para chegar ao local e o som está horrível. Isso é muito importante para nós artistas. As vezes eu toco, mesmo sendo um lugar ruim, mais por conta do público, pelo carinho que o público tem pelo meu trabalho. Eu acho importante, produção grande ou não, ter esse carinho com o artista e tratar bem. Nem que for para ir ao mercado e comprar algumas coisinhas para botar no camarim para se sentir bem. É importante mudar isso no cenário pé de serra porque não adianta dizer que é pelo dinheiro. Se se organizar e tiver isso na mente, vai tratar o artista do jeito que ele merece. Outra coisa importante para nós artistas, independente do lugar, é nossa privacidade. Um camarim e um banheiro, somos pessoas e precisamos nos concentrar para fazer um lindo show.     

EQM-Como não desanimar?
Mestrinho-Basta você se apegar ao que tem de mais sagrado, que é a música e ser uma pessoa otimista. O maior sentido da minha vida é tocar e fazer as pessoas felizes. Enquanto eu puder fazer isso, não vou desanimar nunca.

EQM- Como você escolhe os músicos que tocam contigo?
Mestrinho-Existem algumas questões primordiais, como o caráter da pessoa e o talento. Graças a Deus, eu atraio pessoas do bem, isso para mim nunca foi um problema. Eu me sinto privilegiado de ter a oportunidade de ter músicos como eles. Pessoas maravilhosas como Michael Pipoquinha, Cainã Cavalcante, Leo Rodrigues, Elton Morais e Vini Vim.  

EQM-O que faltam para os músicos do circuito terem a oportunidade de tocar com grandes nomes? Como você os incentiva?
Mestrinho-Não sei o que falta, mas eu incentivo os músicos a estudarem bastante e evoluir sua música ao máximo, pois para estar com os grandes, precisa de talento, dedicação e verdade com sua música. Eu toquei com esses artistas pois eu me dediquei ao máximo e música não é só talento, você tem que trabalhar duro para chegar onde você almeja. 

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EQM- Eu acho que você é um dos principais nomes para levar o forró pé de serra para fora dessa bolha? Você se sente assim, um porta voz do forró para fora desse mundo pequeno?
Mestrinho-Eu não costumo pensar assim, costumo fazer o que eu amo, que é tocar música , mas eu não me coloco neste lugar de levar o forró para fora da bolha. Se isso acontecer, será uma consequência. Eu me dedico ao máximo, toco esse gênero com muito amor e carinho e se tiver que chegar mais longe, eu vou ficar muito feliz

EQM- Como a MPB enxerga o atual forró?
Mestrinho-Acredito que o Forró é a MPB. Esse é meu pensamento sobre o forró. Gilberto Gil é MPB e ele toca forró com muito carinho e enxerga o forró da melhor maneira possível. Forró é um dos ritmos mais popular que a gente tem no Brasil e que origina a identidade brasileira, junto com a bossa nova e o samba. 
EQM- Com quem mais você desejaria tocar? E se pudesse trazer de volta músicos que já morreram, quem você traria para fazer um show juntos?
Mestrinho-Eu nunca toquei com Milton Nascimento, desejaria tocar com ele e com Djavan também. Eu não traria ninguém de volta, pois cada um teve seu papel aqui na Terra, comprimiu muito bem a sua estadia. Mas de um jeito fantasioso, eu traria nada mais nada menos que Dominguinhos.

EQM- A pergunta de um milhão de dólares. Como elevar novamente o forró à patamares como na época de Falamansa?
Mestrinho-Eu não costumo pensar nisso, se soubesse esse segredo, já teria acontecido. Acho que não tem um jeito certo. Falamansa fez a música deles, e botou na praça. Tudo aconteceu naturalmente, o que levou o forró para um nível mais alto. E isso nós agradecemos. Mas eu vivo fazendo minhas músicas, sendo feliz com elas, colocando na praça para as pessoas, com muito amor e carinho e o que tiver de acontecer, vai acontecer. Não tem uma fórmula ou segredo para fazer que isso aconteça. Importante é fazer a sua música com carinho, e amor, independentemente de qualquer coisa e a, naturalmente as coisas acontecem, ou não. Você tem que estar preparado para tudo. 

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